Almanaque vem do árabe al-manakh, que é o "lugar em que o camelo se ajoelha". Ponto de reunião dos beduínos para conversar e trocar informações sobre o dia-a–dia.


segunda-feira, 25 de agosto de 2008

71º DIA - Pressão Antrópica

"Nenhum homem ou rato jamais conquistou estabilidade social, comercial ou econômica. Isso foi conquistado com perfeição, ou até certo ponto, pelas formigas e as abelhas, alguns pássaros e alguns peixes do mar. Os homens e ratos são, até hoje, os animais de rapina mais bem-sucedidos. Aniquilam completamente outras formas de vida. Nenhum deles tem qualquer utilidade para as outras espécies vivas."
Hans Zinsser, Rats, lice, and history, 1943.
PS: Após 65 anos pouca coisa mudou...........

domingo, 24 de agosto de 2008

70º DIA - Mais uma noite.....escrevendo sobre o nada

O que quero escrever é sobre o nada....exatamente....escrever sobre o nada! Falar sobre alguma coisa é fácil...quero ver você se virar quando o assunto for o nada....não vale deixar o papel em branco e dizer que é uma visão mordenista.....nem vale soltar um monte palavras e dizer que é dadaísta.....quero ver a gente se virar para falar sobre o nada....não vale recorrer a definições do tipo o nada é o contrário do tudo.....por que não estaria falando do nada e sim de coisas que por um motivo ou outro deixaram de estar.......Nada é tão dificil quanto falar do nada.....e nada é tão mais repleto e complexo do que o nada.....algo que só se define pelo seu contrário não nos permite experimentá-lo: "nunca tive nada nessa vida!", "não sei de nada!", "nada adiantou!".....todos essas expressões são prova de que não sabemos o que é o nada.....nosso nada é sempre o que nos faltou nunca o que não existiu........ou seja.....escrevi um monte....nada de útil....nada de interessante....nada com sentido....mas o certo é que: não falei do nada....so falei de coisa alguma o que é bem diferente......

segunda-feira, 18 de agosto de 2008

69º DIA - Fanatismo e Tertúlia

Embora 69 seja o único número erótico que se reconheça, o assunto deste dia não é sexo....embora sem o sexo esse dia não aconteceria para mim.....
Pois bem, deixando o devaneio de lado, nada tenho para escrever de fato....mas não posso perder o hábito de ao menos registrar uma ou outra impressão.......Na realidade ja faz algum tempo estive em Brasília e ao visitar a feira, localizada na Torre da Tevê descobri uma barraca que vendia alguns itens bem interessante. A loja chamada Tertúlia vendia camisetas, posters, cartões e pílulas poéticas....isso mesmo, pequenas pílulas transparentes em cujo interior ao invés de sais e outros fármacos, encontramos um pedaço de papel enrolado, onde podemos ler um trecho de um poema. Todos os objetos aliás são poéticos na escolha das imagens e dos textos que os compõem.
Acabei adquirindo um cartão, dois posters, uma camiseta e uma pílula poética (contendo um trecho do poema "Fanatismo" de Florbela Espanca).
Como me lembrei desse poema hoje, deixo-o aqui registrado:
Fanatismo
Minh’alma, de sonhar-te, anda perdida
Meus olhos andam cegos de te ver !
Não és sequer a razão do meu viver,
Pois que tu és já toda a minha vida !
Não vejo nada assim enlouquecida ...
Passo no mundo, meu Amor, a ler
No misterioso livro do teu ser
A mesma história tantas vezes lida!
"Tudo no mundo é frágil, tudo passa ..."
Quando me dizem isto, toda a graça
Duma boca divina fala em mim !
E, olhos postos em ti, digo de rastros :
"Ah ! Podem voar mundos, morrer astros,
Que tu és como Deus : Princípio e Fim ! ...
"Livro de Soror Saudade (1923)

sexta-feira, 8 de agosto de 2008

68º DIA - Discurso de Estocolmo

Albert Camus Prêmio Nobel de Literatura, 1957
"Não posso viver pessoalmente sem minha arte. Mas nunca coloquei esta arte acima de tudo. Se ela me é necessária, pelo contrário, é que ela não se separa de ninguém e me permite viver, tal como sou, no nível de todos. A arte não é aos meus olhos um divertimento solitário. É um meio de comover o maior número de homens oferecendo-lhes uma imagem privilegiada dos sofrimentos e das alegrias comuns. Ela obriga portanto o artista a não se isolar; ela o submete à verdade a mais humilde e a mais universal. E aquele que, frequentemente, escolheu seu destino de artista porque se sentia diferente, aprende rapidamente que ele só alimentará sua arte, e sua diferença, confessando sua semelhança com todos. O artista se forja nesta ida e volta permanente entre ele e os outros, a meio caminha da beleza da qual ele não pode se passar e da comunidade da qual ele não pode se arrancar. Eis porque os verdadeiros artistas não desprezam nada; eles se obrigam a compreender em vez de julgar. E, se eles tiverem um partido a tomar neste mundo, só pode ser o de uma sociedade onde, segundo a grande palavra de Nietzsche, não reinará mais o juiz, mas o criador, seja ele trabalhador ou intelectual. O papel do escritor, ao mesmo tempo, não se separa de deveres difíceis. Por definição, ele não pode se colocar hoje a serviço daqueles que fazem a história: ele está a serviço daqueles que a sofrem. Ou, senão, estará só e privado da sua arte. Todos os exércitos da tirania com seus milhões de homens não o arrancarão da solidão, mesmo e sobretudo se ele consentir em seguir os seus passos. Mas o silêncio de um prisioneiro desconhecido, abandonado às humilhações do outro lado do mundo, basta para retirar o escritor do exílio, cada vez, pelo menos, que ele conseguir, em meio aos privilégios da liberdade, não esquecer esse silêncio e fazê-lo ressoar por meio da arte. Nenhum de nós é suficientemente grande para tal vocação. Mas em todas as circunstâncias de sua vida, obscuro ou provisoriamente célebre, jogado nas prisões da tirania ou livre por um tempo de se expressar, o escritor pode reencontrar o sentimento de uma comunidade viva que o justificará, com a condição que ele aceite, quanto ele puder, as duas tarefas que fazem a grandeza de sua profissão: o serviço da verdade e da liberdade. Já que sua vocação é de reunir o maior número de homens possível, ela não pode se contentar da mentira e da servidão que, lá onde eles reinam, fazem proliferar as solidões. Quaisquer que sejam nossas enfermidades pessoais, a nobreza de nossa profissão sempre buscará suas raízes em dois engajamentos difíceis de manter: a recusa em mentir sobre o que sabemos e a resistência à opressão".
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Tradução de Tristan Dierckx, 23 de junho de 2008. Botucatu – SP.