Almanaque vem do árabe al-manakh, que é o "lugar em que o camelo se ajoelha". Ponto de reunião dos beduínos para conversar e trocar informações sobre o dia-a–dia.


sexta-feira, 8 de agosto de 2008

68º DIA - Discurso de Estocolmo

Albert Camus Prêmio Nobel de Literatura, 1957
"Não posso viver pessoalmente sem minha arte. Mas nunca coloquei esta arte acima de tudo. Se ela me é necessária, pelo contrário, é que ela não se separa de ninguém e me permite viver, tal como sou, no nível de todos. A arte não é aos meus olhos um divertimento solitário. É um meio de comover o maior número de homens oferecendo-lhes uma imagem privilegiada dos sofrimentos e das alegrias comuns. Ela obriga portanto o artista a não se isolar; ela o submete à verdade a mais humilde e a mais universal. E aquele que, frequentemente, escolheu seu destino de artista porque se sentia diferente, aprende rapidamente que ele só alimentará sua arte, e sua diferença, confessando sua semelhança com todos. O artista se forja nesta ida e volta permanente entre ele e os outros, a meio caminha da beleza da qual ele não pode se passar e da comunidade da qual ele não pode se arrancar. Eis porque os verdadeiros artistas não desprezam nada; eles se obrigam a compreender em vez de julgar. E, se eles tiverem um partido a tomar neste mundo, só pode ser o de uma sociedade onde, segundo a grande palavra de Nietzsche, não reinará mais o juiz, mas o criador, seja ele trabalhador ou intelectual. O papel do escritor, ao mesmo tempo, não se separa de deveres difíceis. Por definição, ele não pode se colocar hoje a serviço daqueles que fazem a história: ele está a serviço daqueles que a sofrem. Ou, senão, estará só e privado da sua arte. Todos os exércitos da tirania com seus milhões de homens não o arrancarão da solidão, mesmo e sobretudo se ele consentir em seguir os seus passos. Mas o silêncio de um prisioneiro desconhecido, abandonado às humilhações do outro lado do mundo, basta para retirar o escritor do exílio, cada vez, pelo menos, que ele conseguir, em meio aos privilégios da liberdade, não esquecer esse silêncio e fazê-lo ressoar por meio da arte. Nenhum de nós é suficientemente grande para tal vocação. Mas em todas as circunstâncias de sua vida, obscuro ou provisoriamente célebre, jogado nas prisões da tirania ou livre por um tempo de se expressar, o escritor pode reencontrar o sentimento de uma comunidade viva que o justificará, com a condição que ele aceite, quanto ele puder, as duas tarefas que fazem a grandeza de sua profissão: o serviço da verdade e da liberdade. Já que sua vocação é de reunir o maior número de homens possível, ela não pode se contentar da mentira e da servidão que, lá onde eles reinam, fazem proliferar as solidões. Quaisquer que sejam nossas enfermidades pessoais, a nobreza de nossa profissão sempre buscará suas raízes em dois engajamentos difíceis de manter: a recusa em mentir sobre o que sabemos e a resistência à opressão".
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Tradução de Tristan Dierckx, 23 de junho de 2008. Botucatu – SP.

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