Almanaque vem do árabe al-manakh, que é o "lugar em que o camelo se ajoelha". Ponto de reunião dos beduínos para conversar e trocar informações sobre o dia-a–dia.


segunda-feira, 31 de março de 2008

67º DIA - Pensamento Tibetano do Século VII

"Tudo aquilo que algum filho da puta diz que é URGENTE, sempre é algo que algum imbecil deixou de fazer em tempo hábil e quer que você se foda para fazer em tempo recorde."
Rakesheh Vilmiintuchy - Monge Tibetano

domingo, 2 de março de 2008

66º DIA - Quanta desinformação

Tive o desprazer de ver o Programa Rádio na TV, um desses programas pagos de venda pela TV, apresentado pelo cantor Francisco Alves. Nada contra os produtos oferecidos: Gel Pé, xampu e condicionador escurecedor. E antes que pensem bobagem, não assistia para comprar nenhum deles, afinal não sofro de dores nos pés, nem artrite, nem dor no joelho, nem na perna, nem no calcanhar, câimbras, dor na nuca, má circulação, dificuldades para falar (?) e também não quero pintar os cabelos. Na verdade quando mudei de canal, peguei o apresentador falando sobre aquecimento global, esperava que fosse mais uma das falas a favor do uso de fontes alternativas de energia e pelo consumo racional de energia. Ledo engano! Entre as falas do apresentador havia falas do tipo: “ecologia, ecologista, bando de vigaristas!”, “Por mim eu acabava com todas essas ONGs!”, “Que esse pessoal do Greenpeace devia era trabalhar!”. E para avalizar a sua fala ele apresenta uma reportagem intitulada “A Torre de Babel da sustentabilidade”, matéria publicada em uma revista “F Comércio”. Ele chega a sustentar que “essas ONGs” ficam apresentando teses e teses mas não sabem nada, que os cientistas estão equivocados, mas que a revista do comércio é que está certa. Critica o fato das ONGs receberem dinheiro público para financiarem seus projetos, que me parece a única crítica um pouco mais racional. Agora ele chega a dizer que os as teorias de extinção dos dinossauros estão erradas. Não foi um meteoro que os exterminou e sim sofreram uma mutação (?). Tenta comparar as guerras e a violência humana com os instintos de sobrevivência dos dinossauros. Ao criticar um texto de Arnaldo Antunes sobre o aquecimento global ele diz que todo o “cidadão tem direito de polemizar, mas o Sr. Arnaldo Antunes está do lado errado (?)”. Preconceituoso, falta de inteligência, falta de senso crítico! Tudo isso se encaixa como marca desse programa. “Aquecimento global é bobagem!” “Tem que trazer relatórios de verdade!”. “Essas mudanças são naturais é uma limpeza no mundo!” Mudo de canal exatamente na hora em que ele começa a dizer que “Preto não luta por preto!”, e elogia a National Geographic por que fala sobre a dinastia dos Faraós Negros. Quando entrevistada sobre o papel da televisão, a ex-senadora da República Heloisa Helena, dizia que a qualidade do que se apresentava na TV precisava ser rediscutido, Jô Soares disse a ela que a TV não tem o papel de educar, no que ela prontamente respondeu: “mas ela não pode deseducar!”. De fato o debate sobre os meios de comunicação e sobre um conselho federal de jornalismo precisa ser amplamente rediscutido, sem essa falsa visão de tentativa de censura. Todos os profissionais no país têm o seu Conselho Profissional, CRMV, CRM, COREN, CREA, CREFITO entre outros, menos os jornalistas. Como se pode conceder canal aberto de TV e Rádio para instituições religiosas? Um país laico no quais as freqüências de comunicação são todas do Estado, uma religião pode se sobressair por conseguir mais recursos financeiros, e assim comprar essas concessões? E contrário a essa lógica, uma concessão de rádio comunitária se torna caso de polícia muitas vezes, ou se arrasta indefinidamente na câmara dos deputados para a regulamentação das mesmas, ou por anos até a regulamentação pelo governo. Quando Voltaire dizia que “não concordo com uma só palavra do que dizes, mas defenderei até a morte vosso direito de dizê-lo!”, tenho comigo que ele se referia ao debate com racionalidade, em que posições divergentes abalizadas e fundamentadas na ética, na observação da realidade e na ciência fossem a causa das divergências. Talvez se Voltaire tivesse acompanhado apenas o programa Rádio na TV ele teria mudado o “mas” por um “talvez”. P.S.: Antes que fique mal entendido a única coisa que de fato precisa ser mais bem discutida é o fato de que se são Organizações NÃO Governamentais, por que algumas precisam de dinheiro público para se manter? Mas isso fica para outro ora!

65º DIA - TEMPESTADE - Trilogia

O horizonte é branco. A neve encobre o pára-brisa. Um corpo achado na neve. Caído longe de tudo, sem documentos, sem identificação e ainda por cima com um tiro na perna é mais do que um provável crime, é também um mistério. Transportar um corpo congelado nunca é agradável, não por medo, mas por que é difícil carregar e acomodar no carro. Não se pode mudar as feições azuladas. Não se pode fechar os olhos fixos e congelados. Nem fechar a boca aberta, quase que a balbuciar um pedido de socorro. Não se pode mexer um membro sem quebrá-lo o que no caso não pode ser feito, afinal trata-se de um possível homicídio................................................................... Penso no que terá acontecido? Quem o teria levado até lá? Afinal ele não foi sozinho até lá. Não encontrei nenhuma arma! Nada na verdade que possa servir como pista, como indicio!
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A tempestade de neve já dura algumas horas, mas estou próximo da cidade. Vou deixar o corpo no necrotério e esperar a chegada do legista na próxima segunda-feira!............................................. Olho pela janela é só vejo a neve que cai.............................................. O horizonte é branco.

65º DIA - PASSOS - Trilogia

O horizonte é branco. Nada naquele local chamaria a atenção não fosse o caminhar sôfrego daquele homem. Como pode o instinto fazer com que nas situações mais inóspitas lute-se pela vida, mesmo quando o ambiente diz ser impossível que isso aconteça. Ter sido baleado seria suficiente para fazê-lo desistir de tentar caminhar na imensidão da neve, no entanto ele não o fez. O seguimos sem entendermos porque ele caminhava em frente sem saber ao menos onde estava. Ele havia perdido sangue o suficiente e o seu andar cambaleante entregava a debilidade do corpo.......................................................................................................................................................... Ele caminhou por quase uma hora e percebemos que ele cambaleava tentando dar um passo após o outro.................................................... A sua queda foi suave. Pudemos ver o momento em que se ajoelhou até cair com o rosto colado na neve..................... Esperamos pelo menos quarenta e cinco minutos até termos certeza de que não haveria chances de sobrevivência............................. Contávamos que a neve para encobrir o corpo. Enquanto nos afastávamos olhei para trás e já não podia vê-lo, apenas a imensidão......... O horizonte é branco.

65º DIA - NEVE - Trilogia

O horizonte é branco. Não existe o distante, apenas a dimensão do ir. O frio é denso, palpável............................... Nesse lugar o tempo, as sensações, os sentimentos, tudo ganha novas proporções. Não se conhece a dimensão da solidão até se ver vagando pela neve, orientando-se pelo norte....................................................................................... A qualquer momento pode o tempo mudar e você se vê preso a sua própria solidão. Em nenhum outro lugar pode-se morrer sozinho. Pode-se morrer esquecido numa grande cidade, mas é aqui que podemos de fato morrer sozinho. O perigo iminente da morte, que ronda nossos dias, acaba por se tornar um pensamento constante......................................................Preciso adiantar o passo. Caminhar sobre a neve não é algo fácil, ainda mais depois de ser baleado na perna. A dor tem mantido minha atenção voltada na direção do que espero ser minha chance de salvação. Consegui estancar o sangramento, mas foi suficiente grande o estrago. Suficiente para me deixar sôfrego e cambaleante...............................................................Devo estar caminhando a quase duas horas. Cada passo agora é um enorme esforço. A perna lateja, e sinto o corpo frio. Cenas desconexas passam pela minha cabeça, a infância, meus pais brigando, o colégio interno, o primeiro assalto, a cadeia, o vôo, o acordo, o primeiro beijo, o acerto, o primeiro tiro, o acidente de carro, a neve, a briga no bar, a esposa, os filhos...............................................................A sonolência. Não sei para onde estou indo. Não consigo me manter de pé..................................................................................... O contato da neve com o rosto queima........................... Não sinto minhas pernas............................. Não consigo respirar direito, o ar gelado resseca a garganta quando aspirado......................Não consigo manter os olhos abertos. Olho para o lado, o horizonte é branco...............